“Eu gosto do seu Cristo; o que eu não gosto é dos seus cristãos”

Reflexão de um livre-pensador

Por que o Cristianismo não deu certo? Ou, porque os seus seguidores se tornaram tão diferentes do seu fundador e os seus dogmas tão distintos dos ensinamentos do Rabi de Nazaré? Talvez, porque os que se apossaram das palavras de Jesus tenham sido exatamente as pessoas para as quais Jesus não se dirigia: os religiosos.

Seu público alvo não eram os líderes religiosos, ou aqueles que praticavam formalmente a religião. Quando falava a eles era sempre de forma crítica, mas como quem critica alguém que sabe que está errado, mas não dá o braço a torcer.

Aqueles para os quais o seu discurso era realmente direcionado eram os moradores de rua, as putas, os viados, enfim, todo o lixo que a religião excludente de sua época formava. Ele era sim o Jesus das prostitutas, dos mendigos malcheirosos, dos malandros e de todos quantos já se consideravam condenados e que por isso nem passava pelas suas mentes tentarem uma reconciliação com Deus; e consigo mesmos…

Hoje, os cristãos se identificam muito mais com os antigos fariseus, que pensavam agradar a Deus através de rituais, do que com aquelas pessoas imperfeitas, humanas, e por isso sempre carentes de perdão para quem o Cristo pregava. Tornaram-se assim indiferentes para o Mestre.

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E por que O Filho do Homem desaparece definitivamente após os Evangelhos? Por que não são reproduzidas as suas falas nas famosas epístolas paulinas ou de outros apóstolos? O que aconteceu com aquele Provocador-mor? Suas palavras não foram fortes o bastante para ficarem marcadas no coração daqueles mais próximos a si, ou, justamente ao contrário: de tão fortes nunca foram plenamente assimiladas e aceitas?

Suspeito que a sedução legalista os enganou. Sim, era mais fácil aderir a algo parecido com o que já conheciam do que abraçar a loucura dos ensinamentos do Cristo. Eles se renderam a segurança das normas, das hierarquias, dos rituais, pois nunca se desprenderam verdadeiramente da religiosidade vazia de sua época.

Atualmente, os evangélicos reproduzem o mesmo comportamento: com o passar do tempo se esquecem do personagem Jesus e passam a viver uma rotina religiosa, deixando-se involuntariamente entorpecer pela religiosidade, ou como eu gosto de dizer, pela cultura religiosa igrejeira. Então, já não há mais a consciência do dever de amar ao próximo, e sim o de comparecer aos cultos. O desejo de se santificar, no sentido de tornar-se uma pessoa melhor, é substituído pela busca paranóica pela “santidade” exterior, demonstrada nas vestes e em outros hábitos assépticos no intuito de “não se contaminar com o mundo”.

Faço minhas as palavras do Gandhi quando disse que “gosta do Cristo, mas não gosta dos cristãos, pois eles são muito diferentes do seu Cristo”. A multidão de “desigrejados”, aqueles que não aceitam mais se colocar sob uma liderança religiosa formal não é culpa apenas da mentalidade pós-moderna. É reflexo de mais de dois milênios de mal-entendidos; de se remendar panos novos com velhos trapos teológicos; de se tentar armazenar o vinho novo da Graça nos odres velhos do legalismo.

Aos pensadores cristãos – ou ao menos sob forte influência de uma criação evangélica -, só resta admirar ao Jesus que sobreviveu em suas mentes e corações, não obstante as pregações distorcidas que foram obrigados a ouvir por toda vida a seu respeito.

Quanto a mim, ironicamente cabe-me terminar um texto sobre Jesus citando, mutatis mutandis, o autor de “O Anticristo”: “Cristo morreu cedo demais. Se ele tivesse vivido até a nossa época, ele teria repudiado a sua doutrina”. Alguma inverdade?

Autor: Isaias Medeiros

Fonte: https://cpfg.blogspot.com.br/2010/06/eu-gosto-do-seu-cristo-o-que-eu-nao.html

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